Desventuras em Série (2017-) - 1ª Temporada

Gostaria de começar dizendo que fazia muito tempo que não via tanto esforço criativo e, principalmente, publicitário, para fazer uma série acontecer como o que houve por parte da Netflix em relação a Desventuras em Série. Acredito que esse esforço se deva ao fato de essa ser já a segunda tentativa de adaptar os livros de Lemony Snicket (pseudônimo), sucedendo o filme de 2004, que desperta opiniões mistas nos fãs. Esteve, então, desde o início, bem nítido que tanto a Netflix quanto Daniel Handler e as outras pessoas envolvidas na concepção/feitura/divulgação da série fizeram todo o possível para garantir que tudo desse certo, para que se transmitisse os livros para a série da melhor maneira possível. Toda essa preocupação visível me deixou impressionado, mas também preocupado, porque criou expectativas que talvez não fossem ser cumpridas. No entanto, após assistir à primeira temporada da série, que estreou mais cedo esse mês de Janeiro, posso dizer que minhas expectativas foram atendidas.

Não vou entrar, neste post, em detalhes em relação à trama, já que ela é a mesma dos livros, sobre os quais escrevi em meu último post, que pode ser acessado clicando aqui. Falarei, em vez disso, das minhas impressões sobre a adaptação, complementarmente ao que disse anteriormente acerca dos livros.

 É indescritível a sensação de poder reviver a atmosfera dos livros de maneira tão vívida como em algumas cenas da série. A ambientação, os personagens e, principalmente, os diálogos, procuram transmitir as mesmas sensações dos parágrafos e diálogos dos romances de Lemony Snicket. E, para mim, acima da fidelidade religiosa ao enredo (que também pode ser encontrada, de certa forma, nessa adaptação), a fidelidade que realmente importa tem a ver com a essência, com a preservação do sentimento que o leitor/espectador terá vivenciando aquela história e das reflexões que fará.

Quanto às atuações, tenho lido muitas reclamações sobre elas. Não sou nenhum especialista em atuação e nem um pouco entendido de questões técnicas envolvendo produções audiovisuais, mas, como leigo, achei as performances dos atores bastante satisfatórias. As crianças estavam ótimas, os adultos foram fiéis na representação que Snicket faz deles em sua trama e achei que Neil Patrick Harris conseguiu, de uma maneira geral, captar bem as nuances de Conde Olaf, que talvez seja o personagem mais complexo da história (e digo isso com relativa imparcialidade, pois não acompanhei os trabalhos anteriores dele que o fizeram ser tão amado e lhe legaram uma enorme fã-base).

Já em relação ao enredo e às mudanças e acréscimos feitos, achei todos muito compreensíveis, sendo que a maioria deles me deu mais empolgação em assistir à série, por se tratarem de informações novas para que leu os livros. As mudanças feitas (e tento aqui não dar spoilers) são quase todas no sentido de introduzir mais cedo uma trama maior e mais conspiratória que simplesmente os órfãos fugindo do Conde Olaf, o que nos livros só começa a acontecer a partir do quinto volume. Eu julgo plenamente razoável esse direcionamento, visto que o esquema dos primeiros livros não funcionaria tanto numa série, que é estruturada em "temporadas", já que não deixaria nenhuma parte do mistério para a primeira temporada (que só cobre até o quarto livro), e poderia dar aos espectadores uma sensação de ciclo infinito e, então, fazer com que não continuassem a série ou não achassem tão interessante assim. Fora isso, o próprio Daniel Handler disse em entrevista que a sutileza empregada nos livros não funcionaria bem numa série, que esta demandaria algo mais explícito. Assim, por exemplo, a viagem do Tio Monty ao Peru, sobre a qual os fãs dos livros somente teorizavam, na série tem suas intenções verdadeiras plenamente expostas. Formatos diferentes possuem demandas diferentes, e não há nada de errado com isso. Por isso esclareço, ainda, que apesar de ter amado a série, não acho que a experiência que ela proporciona substitua a dos livros, mas que complementa. Portanto, a quem gostou da série, recomendo enormemente que vá atrás do material-fonte, os livros de Lemony Snicket/Daniel Handler, para expandir sua experiência com esse universo tão bacana.

Por fim, queria expressar aqui minha felicidade e alívio quanto à forma com que Sunny foi representada na série. Dos três irmãos, ela sempre foi a minha favorita. Adorei o modo que arranjaram de manter a fala peculiar dela. Além disso, foi, ainda bem, preservada a personalidade perceptiva e sensata que ela possui: seus comentários são sempre mais sensatos e realistas se comparados aos de seus irmãos e aos dos outros personagens em geral. Uma das minhas maiores alegrias quanto a essa adaptação foi o fato de terem feito jus a Sunny Baudelaire.